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21/03/2016Pior que Margaret Thatcher
Bom, antes de qualquer coisa, vamos fazer um breve resumo sobre Margaret Thatcher, que está no título do artigo e foi a primeira-ministra do Reino Unido entre 1979 e 1990, não foi alguém lá que o Reino Unido tanto ama, afinal a popularidade de Thatcher com o povo era (e ainda é) bastante baixa, mesmo depois da morte dela em 2013. Entretanto, como o assunto aqui é futebol, o pior mesmo foi o que ela fez com o nosso tão amado esporte enquanto primeira-ministra, afinal quem é fã de futebol popular e tem aversão ao futebol moderno, com certeza não deve ser fã de Thatcher, que pode ter sido a precursora da modernização precária do futebol que vemos hoje.
Thatcher odiava sindicatos, sindicalistas eram inimigos do governo dela e a “Dama de Ferro” os considerava uma ameaça à ordem pública, assim como torcidas organizadas, que por sinal tinham fortes ligações com sindicatos. Muitas torcidas até hoje simplesmente odeiam Margaret Thatcher, a principal é a do Liverpool, que Thatcher chegou a chamá-los de “hooligans” (desordeiros) e “bêbados”, principalmente depois da tragédia após a final da UEFA Champions League de 1984/1985 entre Liverpool e Juventus, que 39 torcedores da Juve morreram e o Liverpool foi punido com uma suspensão do torneio de cinco anos. Também teve o caso da Tragédia de Hillsbourgh em 1989, aonde 96 torcedores morreram e 766 ficaram feridos após uma partida entre Liverpool e Nottingham Forest, estes são apenas dois de vários incidentes da época que não só envolviam Liverpool. Relatórios oficiais, que saíram muitos anos depois, culparam a péssima conservação dos locais e as autoridades em quase todos os casos, e não os torcedores como havia dito Thatcher.
Ainda sim, antes mesmo destas tragédias, Thatcher ordenou patrulhamentos severos em todos os estádios e queria até criar um cartão de identificação para registro dos torcedores, sem sucesso (aqui no Brasil tentaram fazer o mesmo, mas também não obtiveram sucesso). Os resultados das políticas contra o futebol adotadas por Margaret Thatcher foram: precarização e elitização do esporte, com aumento exorbitante dos ingressos, que praticamente inviabilizou que torcedores mais pobres pudessem comparecer aos jogos. Thatcher viria a falecer em 2013 e a ideia de colocar um minuto de silêncio em respeito à morte de Thatcher nas partidas da Barclays Premier League foi aceita apenas pelo Reading e o Wigan Athletic, não só porque nunca tiveram problemas com Thatcher como também os donos são empresários milionários, afinal a turma dos empregados e torcedores de clubes como Liverpool e Manchester United sentiam muita aversão à Margaret Thatcher.
Como já puderam perceber, Thatcher não foi uma pessoa muito boa para os ingleses e britânicos no tocante ao futebol, mas teria alguém que poderia ser pior do que ela? Sim, a nossa muralha escolhida de hoje, o goleiro Ricardo. Se você reparar bem na capa, Ricardo está a defender um pênalti de Vassell sem as luvas e isto não é impressão sua. Neste dia, Ricardo seria o pesadelo de muitos ingleses na Eurocopa 2004 e o pior, seria de novo um monstro para os ingleses dois anos depois em uma Copa do Mundo, ambas nas quartas-de-final de cada torneio.
A Eurocopa de 2004 foi sediada em Portugal e teve um final triste para os donos da casa, que chegaram a grande final do torneio e perderam para a surpreendente Grécia. Os gregos nem se classificariam para a Copa do Mundo de 2006, mas derrotaram duas vezes a poderosa seleção portuguesa na Eurocopa de 2004, a primeira na fase de grupos e a segunda na grande final. Na fase de grupos, apesar da derrota para a Grécia, Portugal se classificaria em primeiro lugar após vencer os outros dois jogos, Grécia deixaria para trás a Espanha, grande favorita a passar de fase junto com Portugal.
As quartas-de-final seriam contra a Inglaterra. Logo no segundo minuto de jogo, após erro de Costinha, a eterna promessa Michael Owen abriria o placar para os ingleses, mas Portugal empataria no tempo normal apenas aos 36 do segundo tempo com Hélder Postiga. Aos cinco minutos do segundo tempo da prorrogação, Rui Costa marcaria um golaço e viraria para os portugueses, mas cinco minutos depois, Lampard empataria e faria a disputa ir para os pênaltis. Nas penalidades máximas a série de cinco penalidades terminara em 4×4, com Beckham e Rui Costa isolando os pênaltis para cada lado, a disputa acabaria na “morte súbita”, as primeiras foram convertidas, na sétima rodada, Ricardo tira as luvas e conta: “O momento de tirar as luvas foi instintivo, foi uma maneira que arranjei para me motivar a mim próprio e para tentar, de alguma maneira, desmotivar o adversário” e deu certo, pegou o pênalti de Vassell e ele mesmo converteu a última cobrança para Portugal se classificar a semifinal da Eurocopa.
Já não bastava ele ter feito história, sido uma lenda no jogo e assombrar os ingleses, ele repetiria uma façanha em pênaltis contra a Inglaterra na Copa do Mundo de 2006. Inglaterra e Portugal chegaram as quartas-de-final do torneio e iriam se enfrentar, o jogo terminou 0x0 no tempo normal e prorrogação e iria ser novamente decidido nos pênaltis. Os portugueses Hugo Viana e Petit desperdiçariam as cobranças, chutando na trave e pra fora respectivamente, mas de quê isto adiantaria? Afinal Ricardo pegaria nada mais nada menos que as cobranças Carragher, Gerrard e Lampard, a disputa terminara em 3×1 para Portugal, que avançaria para uma semifinal de Copa do Mundo depois de quarenta anos.
Agora sobre a carreira e vida da nossa muralha de hoje, Ricardo nasceu em 11 de Fevereiro de 1976, na cidade portuguesa de Montijo. Ricardo começou profissionalmente pelo clube da cidade em que nasceu, o Clube Desportivo Montijo, da II Divisão B portuguesa. Ricardo, no começo, jogava como atacante, queria ser o pesadelo dos goleiros, mas ele acabou virando pesadelo dos atacantes e foi catar no gol. Jogou apenas dezoito jogos pelo Clube Desportivo Montijo e, em 1995, foi vendido para o Boavista, time da primeira divisão portuguesa. No Boavista, Ricardo entraria para a história do clube e se tornaria ídolo por lá. Apesar ser vendido em 1995, estreou em uma partida oficial pelo Boavista apenas em 1997, contra o Belenenses em um jogo que terminou empatado em 1×1.
A Primeira Liga portuguesa até hoje teve 81 edições (a 82ª está em andamento) e os times que participaram de todas as edições da primeira divisão portuguesa foram apenas Benfica, Porto e Sporting, estes mesmos times são os que dominam a primeira divisão portuguesa, que possuem juntos 79 edições conquistadas (Benfica com 34 títulos, Porto com 27 e Sporting com 18), apenas duas vezes estes times não sairiam campeões, a primeira vez seria na temporada 1945/1946 em que o Belenenses sagraria-se campeão e outra seria com o Boavista de Ricardo, na temporada 2000/2001.
Ricardo seria essencial para a conquista do título, sendo o goleiro menos vazado da temporada e com o time sofrendo no campeonato inteiro apenas 22 gols nos 34 jogos disputados, destes 34 jogos, Ricardo foi titular em 28 ocasiões. Antes da mais importante conquista da história do Boavista, com este mesmo clube, Ricardo já havia conquistado em 1997 a Taça de Portugal (primeiro troféu do mesmo como jogador) e no ano seguinte ganhou a Supertaça de Portugal.
Estes anos foram os melhores senão o melhor na história do modesto Boavista e com Ricardo a frente do time. Ricardo foi até convocado pelo até então técnico português Antonio Oliveira para a Copa do Mundo de 2002, em que ele seria reserva e não jogaria um jogo sequer. Naquela Copa do Mundo, Portugal seria eliminada logo na primeira fase, depois de perder surpreendentemente para os Estados Unidos por 3×2 e também para a Coréia do Sul por 1×0, em um dos maiores roubos daquela Copa do Mundo em favor dos sul-coreanos. Os mesmos sul-coreanos chegaram na semifinal daquela Copa do Mundo, sendo eliminados pela Alemanha e acabaram perdendo a decisão de terceiro lugar por 3×2 para a Turquia, mas só chegaram lá graças a ajuda da arbitragem em jogos contra Portugal, Espanha e Itália.
Depois daquela Copa do Mundo, o técnico do nosso pentacampeonato (e do vergonhoso 7×1 também), Luiz Felipe Scolari, iria a frente ao comando luso, Ricardo então tornara-se titular da seleção portuguesa com Felipão e também um grande amigo pessoal dele, algo um pouco semelhante com o que aconteceu com Marcos quando Felipão foi técnico da seleção brasileira. Ricardo passaria a ter as titularidades lusas a partir de 2003, no mesmo ano em que seria vendido para o Sporting.
Pelo Sporting seria o goleiro titular, jogaria lá por até os anos de 2007, nunca conseguindo ser campeão nacional da primeira divisão mesmo estando a atuar em um dos três grandes portugueses, sempre saindo nos resultados finais em terceiro ou em segundo lugar. No meio do futebol de clubes internacional, Ricardo chegaria na final da Europa League 2004/2005, esta final seria jogo único (como é de regra nos torneios internacionais de clubes europeus) e o local decidido para a final foi justamente o estádio do Sporting que disputara a final contra o CSKA Moscow e aprontariam uma vergonha, o Sporting perdera em casa de 3×1 saindo ganhando a partida e teriam de se contentar apenas com o vice-campeonato da edição.
Neste período, pela seleção portuguesa, Ricardo disputou a Eurocopa 2004 como o goleiro titular, como dito, foi herói e fez seu nome no jogo contra a Inglaterra convertendo o último pênalti e defendendo o pênalti de Vassell sem luvas, mas na grande final, não bastava Portugal perder em casa a final (já que era o país-sede daquela Eurocopa), Ricardo seria considerado o culpado daquela derrota por 1×0 aos gregos visto que não saiu bem do gol na cabeçada de Charisteas oriundo de um escanteio.
Entretanto, ainda sim, Ricardo continuaria a ser convocado pelo teimoso Felipão (que todos nós conhecemos bem a teimosia dele) e tanto Ricardo quanto Scolari iriam calar a boca dos críticos com a classificação dos lusos à Copa do Mundo de 2006 e até aonde os mesmos chegaram. Portugal viria a cair no grupo D da Copa e venceria todos os jogos contra México, Irã e Angola, Ricardo seria o goleiro titular da seleção portuguesa e teria tomado apenas um gol. Nas oitavas-de-final, Portugal passaria pelo placar mínimo de 1×0 sobre a Holanda em um jogo marcado por quatro expulsões, duas para cada lado. Nas quartas-de-final, outro heroísmo de Ricardo, após um jogo terminado em 0x0 no tempo normal e prorrogação, Portugal se classificaria às semifinais após quarenta anos nos pênaltis, com Ricardo defendo três. Portugal viria a cair nas semifinais, perdendo de 1×0 para a França com um gol de pênalti de Zinedine Zidane, Ricardo iria acertar o canto, mas a bola foi rente a trave, sem chances para Ricardo. Portugal iria terminar em quarto lugar na Copa do Mundo de 2006, pois perdera a disputa de terceiro lugar para a Alemanha por 3×1. Nesta Copa, Ricardo foi o segundo goleiro com mais defesas, ficando atrás somente de Gianluigi Buffon.
Em 2007, Ricardo saiu do Sporting e foi vendido ao Real Betis da Espanha, lá ele era goleiro titular e assim seguiu também na seleção portuguesa com Felipão até a Eurocopa de 2008. Na Euro, Portugal foi a primeira colocada no grupo A, mas foi eliminada pela Alemanha nas quartas-de-final pelo placar de 3×2 e Ricardo, mais uma vez, foi considerado culpado pela derrota e pelo mesmo motivo da Eurocopa de 2004, a saída de gol. Aquele seria o último jogo de Felipão no comando de Portugal, que rumara para o Chelsea e fora substituído por Carlos Queiroz. Seria também a última partida de Ricardo com a camiseta lusa, muito se daria após a falha contra a Alemanha e que Queiroz iria dar preferência de titularidade ao goleiro Quim, do Benfica.
Ricardo que chegou ao Betis como titular e era a primeira opção, com o tempo (após a Eurocopa de 2008) passou a ser o goleiro reserva e por assim o seguiu até o final da carreira no ano de 2014. Ricardo não viria mais a conquistar títulos, viria a jogar em 2011 pelo Leicester, no mercado de inverno do mesmo ano viria a se transferir para o Vitória de Setúbal, voltando a jogar pelo país de origem após quase cinco anos, ficara um ano no Vitória de Setúbal e depois iria para o Olhanense em 2012 aonde encerraria a carreira em 2014, Ricardo se aposentara um pouco em baixa, mas ainda sim, com muita história para contar e se tornando um goleiro ícone. Em 2012, em uma entrevista ao GloboEsporte, Ricardo disse que teve clube brasileiro (não revelou o nome) o sondando, disse que seria uma honra encerrar a carreira no Brasil, mas acabou que não passou de palavras.
E este foi o terceiro Muralhas Lendárias aqui no Goleiro de Aluguel, abordando a carreira de “São Ricardo”, como foi apelidado pela torcida portuguesa após as defesas de pênalti. Semana que vem, o quadro vai abordar mais um grande jogo e um grande goleiro, estejam livres para dar sugestões e até a próxima!
Portugal 2(6)x(5)2 Inglaterra 2004 – Link do Vídeo
Inglaterra 0(1)x(3)0 Portugal 2006 (pênaltis – narração portuguesa emocionante)